No topo da decepção

Jessé Souza*

Já percorri quase todo o Estado desde quando comecei a trabalhar na área de comunicação, em 1991. Naquela época, para as minhas condições financeiras, uma máquina fotográfica era impensável. Então, não tenho registros das minhas andanças pelos locais mais remotos e mais espetaculares desta Terra de Makunaima.

Na verdade, eu não tinha muita pretensão com as idas ao interior do Estado, a não ser cumprir o meu trabalho ou concluir o passeio, pois eu achava um fato normal ir a um lugar sem registrar nada, sem absorver o encanto de bichos, gentes, coisas e natureza. Somente depois de chegar às quatro décadas e meias de vida é que percebi que deixei muito para trás.

Então, hoje sinto a necessidade de voltar e de ir àqueles onde não tive a oportunidade de conhecer, como a região do Baixo Rio Branco.  A necessidade não é tão somente pessoal, mas profissional também a fim de divulgar o que Roraima tem de espetacular, como forma de mostrar que temos um potencial rico para explorar economicamente.

De volta quase duas décadas depois a alguns destes locais, percebo que o bicho homem não tem dispensado o cuidado necessário ao meio ambiente. Do topo de serra a lagos mais distantes, lá estão as marcas das pegadas: latas de cerveja e de refrigerantes, garrafas, plásticos e outros lixos produzidos por quem não tem a consciência de recolhê-los de volta.

Até mesmo onde a comunidade já atingiu um nível bom de consciência, as agressões são constantes praticadas principalmente por visitantes interessados tão somente em desfrutar da natureza sem ter o mínimo cuidado em preservá-la. Muitos sequer vão em busca de apreciar o belo e o exótico ou desfrutar do equilibro ecológico, mas tão somente de um lugar diferente para praticar a falta de respeito e de civilidade.

É revoltante chegar ao topo de uma serra, por exemplo, e ver que muitos passaram por lá e deixaram lixo ou até mesmo pichações. É como se existisse algo no ser humano que o impedisse de enxergar que o mundo precisa de equilíbrio para continuar existindo. E que cada um é responsável por manter o meio ambiente sem agressões.

Nos lagos, rios e igarapés o cenário é o mesmo, com todo tipo de lixo boiando nas águas, engatado nas plantas aquáticas ou lançado na mata ciliar. Isso sem contar com a destruição pura e simples da vegetação, seja por meio do fogo ou da motoserra. E o pior: sem qualquer ação governamental para educar ou fiscalizar.

Retornar a estes locais para registrar o que deixei para trás poderia significar apenas alegria e êxtase por reencontrar a natureza. Também tem provocado muita decepção com o bicho homem, que acha que pode desfrutar de tudo isso sem ter nenhuma obrigação. É simplesmente revoltante.


P.S.: Texto publicado originalmente na Folha de Boa Vista

*Jornalista
jesseroraima@hotmail.com

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Damurida com Xibé

Deputado federal na mira da Operação Arcanjo

Filha de magistrado é servidora do governo, mas mora em Goiânia