Pedra, telhado e vidro

Jessé Souza*


A discussão sobre o papel e os limites da imprensa não é de hoje. Arrasta-se ao longo dos anos desde a abertura democrática e se ampliou com a chegada da internet e a popularização das redes sociais. Os profissionais de imprensa, aqueles comprometidos com sua profissão, conhecedores da liberdade de imprensa e dos limites dos direitos individuais, sabem que caminham em uma linha tênue no dia a dia de seu trabalho.


Porém, essa é uma discussão a ser ampliada para toda a sociedade a partir da chegada de telefones celulares que gravam vídeos e tiram fotos que podem ser publicados instantaneamente nas redes sociais. Cada cidadão munido de um aparelho móvel com acesso à internet agora precisa conhecer seus limites além da liberdade de expressão e de divulgação.

A imprensa que explora programas policialescos excedem, sim, em suas atuações em busca do sensacionalismo, seja por meio da fofoca, da violência e da frivolidade. E nem estou me referindo aos programas regionais. Esta realidade é em nível nacional. Basta ligar a TV aberta a qualquer hora da tarde.

Porém, antes de querer esfolar vivo um profissional de imprensa (ou que se diz profissional) que por ventura esteja se excedendo na captação de imagens das desgraças alheias, é preciso que o cidadão comum também analise seu comportamento mediante cenas de violência urbana na internet, com a infestação de sangue, corpos mutilados e situações vexatórias envolvendo pessoas expostas diariamente.

Os profissionais de imprensa estão sendo cobrados diariamente a se pôr no lugar dos familiares e amigos de vítimas - e com toda razão. É obrigação do jornalismo estar vigilante e sendo chamado à consciência ética diariamente nesse novo mundo de compartilhamento nas redes sociais.

Porém, será que os cidadãos estão cobrando da imprensa o comportamento ético, pedindo respeito aos familiares de vítimas, mas não estão se colocando nessa cobrança ética também? Acham que é somente a imprensa que tem de respeitar acidentados no trânsito estirado no chão, corpos desovados e esquartejados?

Pelo poder que tem, a imprensa deve ser monitorada diuturnamente, cobrada, confrontada e contestada. Mas a democratização da internet com a popularização das redes sociais colocou o cidadão comum nesse questionamento, também.

Na mesma medida em que cobra a imprensa e sai por aí esfolando profissionais a serviço da imprensa acusados de invadir a privacidade e de não respeitar a dor de famílias de vítimas da violência, o cidadão tem que se colocar como vidro, e não mais apenas como pedra.

A consciência ética nessa Era de visibilidade midiática e compartilhamento agora passou a ser coletiva, a partir também do cidadão “armado” de celular, redes sociais e WhatsApp. Antes de apontar o dedo, a sociedade agora terá que colocar a mão na consciência quando se trata de liberdade de expressão e direitos individuais.

P.S.: Artigo publicado originalmente na Folha de Boa Vista

*Jornalista
jesseroraima@hotmail.com

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