Bonitinha, mas...

Jessé Souza*

O caso da “prefeita ostentação”, como ficou conhecida a prefeita afastada de Bom Jardim (MA), Lidiane Leite da Silva, de 25 anos, é um fato para ser analisado à luz do comportamento do brasileiro em relação a aparências e do preconceito. Para que ainda não sabe, é bom frisar que ela está presa por roubar o dinheiro da merenda escolar.

Com toda certeza, ela foi eleita pelos moradores daquela cidade pobre do Maranhão por sua aparência e provavelmente por suas enganações advindas da demagogia de políticos que sabem que o povo costuma a se submeter a este tipo de expediente. Era tão segura de suas artimanhas, que ostentava nas redes sociais sua riqueza conquistada roubando merenda das criancinhas.

“Mas como pode uma moça tão bonita roubar assim?”, espantaram-se aqueles que medem as pessoas pela superficialidade das aparências. Isso é tão real que pode ser ampliado para outros casos: “Era tão bonita para morrer assim...”. Ou seja, se fosse feia, poderia morrer da mesma tragédia que o impacto poderia ser menor.

Na política, isso é danoso para a sociedade, pois os discursos são medidos pela demagogia e o caráter do candidato pela aparência física. Não podemos esquecer que muitos votaram no Collor de Melo pela sua lábia e por sua aparência de um jovem que se mostrava bonito, vigoroso, esportista e decidido a caçar marajás.

Somos tão vulneráveis a esta superficialidade a ponto de as redes sociais se tornarem um medidor de comportamento com “selfies” narcisistas e  “curtidas” mais direcionadas a aparências do que pelas ideias lançadas ou pelos debates de assuntos sérios.

Essa fachada vai mais além, quando as pessoas passam a criticar o gordo, o que não se submete aos modismos das roupas, aos que não aderem aos movimentos superficiais do momento, ao movimento político baseado no extremismo e no esfolamento.

A propósito, um parêntese: nunca vi a foto de uma criança negra da África, morrendo de inanição, virar anjinho nas montagens de fotos e cartuns de campanhas que comovem o mundo. Mas uma criança branca que morreu na praia ganhou asas e se tornou símbolo. E o que dizer disto? Ou vão dizer que estou invocando o racismo?

É com espantosa superficialidade que as pessoas julgam, decidem e movimentam as redes sociais com o que elas acham correto ou não. E com o preconceito e aparências é que muitos escolhem seus candidatos, a exemplo da prefeita que roubou o dinheiro da merenda escolar das crianças maranhenses.

Precisamos rediscutir o Brasil de verdade, aquele de fachada, da falsa democracia racial, o do fascismo na política, do extremismo nas relações sociais; e aquele dos que não estão amparados pela aparência, pela estética, pelos movimentos que não querem respeitar sequer as diferenças de cor, de credo, de partidos, de sexo, de pensamentos...

P.S.: Artigo publicado originalmente na Folha de Boa Vista

*Jornalista
jesseroraima@hotmail.com
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