Política do esfola-e-mata



O que impressiona é o avanço de uma política do “esfola e mata”, que se amplia feito erva daninha a partir das redes sociais. É como se estivéssemos vivendo um “apocalipse zumbi”, em que a desumanização tornou-se regra de sobrevivência. A esperança saiu do discurso, a tolerância tornou-se quase uma ofensa e pedir justiça pelas vias legais e regras democráticas virou um sinal de demência.

Quem está com a farda representando o Estado e a lei não hesita em esfolar quem lhe olha feio ou resmunga por seus direitos. É como se fosse um estado de exceção velado, no qual as leis só devem ser cumpridas quando tiver alguém olhando, a imprensa registrando e a sociedade monitorando. Quando os olhos fecham e as câmeras desligam, vale o esfolamento geral.

A regra está se tornando o inverso do que diz a lei: agora todos são culpados até que provem o contrário. Parece que há uma ânsia de eliminar tudo aquilo que conquistamos a duras penas, como a democracia, as leis cidadãs, as cláusulas pétreas da Constituição, a liberdade de expressão e tudo o que se pode invocar em nome da Justiça.

É inegável que a corrupção é o grande mal a ser extirpado, há um sentimento de que corrupção é só “lá em cima”, coisa de “comunista”. Aqui em baixo, poucos fazem questão de cumprir com sua parte na moralização da Nação. E assim surge policial que aceita propina para liberar preso, o terceirizado fazendo esquemas com veículos apreendidos, o servidor que desvia gasolina do carro do local de trabalho... E assim por diante.

Ninguém quer ajeitar seu telhado para depois consertar o telhado alheio e o telhado da Nação. Dentro dessa política do pega-e-esfola, o outro, o desconhecido, é o bandido em potencial, sem direito à defesa, ao contraditório. A ele os rigores da lei e do que não é lei, como a pena de morte. A regra é atirar e depois perguntar, esculachar e depois ouvir a defesa.

Os arrozeiros passaram meses fechando rodovias e protestando no Centro Cívico, mas ninguém reclamou. Mas, bastou os índios fecharem a estrada para logo surgirem discursos racistas e preconceituosos. Porque o discurso político “em nome do desenvolvimento” vale mais do que as verdadeiras intenções por trás dos atos.

E assim vamos construindo uma realidade fascista, que prega o ódio, a truculência e até a morte como solução imediata. Chegam até mesmo a volta do militarismo, mas estes que pedem o retorno dos militares são os primeiros a reclamar na hora de serem abordados pela polícia e pelo Exército.

Há um desvario completo. E muita gente parou de racionar, porque pensar dói e construir um país melhor dá muito trabalho. Então, neste sentido, é melhor adotar o esfolamento como regra a buscar o caminho da sabedoria. O ódio está querendo vencer...

P.S.: Este artigo foi publicado originalmente na Folha de Boa Vista

*Jornalista

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